
Este processo mostra os cuidados
dos tutores de um lado em preparar e ajuizar uma ação contra o veterinário, e
de outro, dos profissionais em instruir bem em sua defesa.
Em sua acusação, diz que deve ser
reconhecida a responsabilidade do veterinário pela morte de sua cadela, tendo
em vista que agiu com negligência e imperícia, pois tinha bloco operatório frequentado
por pessoas estranhas ao quadro da empresa, bem como falta de exame
pré-operatório e de entrevista prévia direcionada. Acrescenta que conforme o
Código de Defesa do Consumidor diz que a responsabilidade do veterinário é
objetiva, logo, assume o risco pela atividade que exerce. Acrescenta ainda que
a prova testemunhal mostrou a boa saúde do animal antes de ser levado para uma
simples castração junto ao veterinário.
O veterinário contesta, e não
nega que o animal da tutora faleceu em suas dependências quando foi levado para
castração. Apenas argumenta que não teve qualquer responsabilidade pelo
ocorrido, sendo que a morte da cadela decorreu dos riscos normais da cirurgia,
pois foram realizados todos os exames clínicos de rotina para confirmar a boa
saúde do animal, bem como verificada a freqüência respiratória e cardíaca e a
temperatura do animal, sendo que estava tudo dentro da normalidade.
Ocorre que, após o veterinário
responsável ter aplicado o medicamento pré-anestésico, no decorrer do
procedimento cirúrgico após a tricotomia e a limpeza da região cirúrgica,
constatou-se que o animal apresentava leve queda de temperatura seguida de
alteração na freqüência cardíaca e respiratória, bem como pressão sistólica.
Afirma o veterinário que, embora tenha aplicado medicação para reverter a queda
da freqüência cardíaca e realizada entubação oro traqueal em virtude da
alteração respiratória, o animal parou de respirar, sendo constatada a ausência
de batimentos cardíacos. O profissional tentou ainda realizar manobras de
ressuscitação cardiopulmonar, o que foi infrutífero, vindo o animal a falecer.
Acrescenta ainda que a necropsia constatou que a morte deu-se por congestão e edema
pulmonar e gastroenterite, o que não demonstra que houve erro no procedimento
cirúrgico, pois tais diagnósticos são verificados normalmente após a morte do animal.
Na fundamentação do magistrado,
disse que o caso é de relação de consumo. No entanto, não se aplica
automaticamente a inversão do ônus da prova, tendo em vista que neste caso não
ocorreu à verossimilhança ou hipossuficiência. Embora seja evidente que a tutora
não apresenta conhecimento técnico equivalente à veterinária em relação ao procedimento
realizado, bem como sobre os riscos e os erros que poderiam ocorrer,
consigne-se que a prova pericial dependia de mero requerimento da parte, não
havendo de se falar em hipossuficiência da autora/tutora, pois, para formular quesitos
e impugnar o laudo pericial, a autora/tutora poderia valer-se da nomeação de
assistente técnico de sua confiança. É claro que não seria possível a realização
de perícia no animal, tendo em vista o tempo já decorrido. Porém, não se pode
ignorar que era perfeitamente possível a realização de perícia técnica indireta
diante do laudo da necropsia, do qual constaram os seguintes diagnósticos:
“congestão e edema pulmonar; gastroenterite” Diante das informações contidas no
processo, não é possível deduzir se a morte do animal foi em decorrência da
imperícia do veterinário.
A única prova produzida nos autos
consistiu no depoimento pessoal da representante do veterinário e na oitiva de
testemunhas. As duas testemunhas arroladas pela tutora nada souberam informar
sobre o ocorrido, sendo que nem sequer presenciaram o procedimento. Já as
testemunhas arroladas pelo profissional confirmaram que o óbito da cadela não
foi ocasionado por erro do veterinário.
O próprio veterinário que
realizava o procedimento cirúrgico na cadela no momento do falecimento afirmou
que tomou todas as medidas preventivas exigidas no pré-operatório, bem como
utilizou de todos os recursos para salvar o animal, sendo que a clínica
veterinária possuía todos os equipamentos e condições para a realização do
procedimento de castração. A testemunha afirma ainda que o laudo de necropsia
mostra-se inconclusivo, pois os diagnósticos constatados são achados comuns
após a morte do animal. O veterinário conclui seu depoimento, dizendo que não
há como afirmar a causa da morte. Indagado sobre a possibilidade de a cadela
ter tido alguma reação alérgica, o veterinário afirmou que na medicina
veterinária não é feito teste antes da anestesia.
A outra testemunha arrolada pelo
veterinário que acompanhou o ocorrido informou que foram realizados todos os
exames pré-operatórios e que a clínica apresentava condições e equipamentos
necessários à realização do procedimento. Disse que a reação anafilática por
conta da anestesia é possível, mas os estudos demonstram que é muito raro,
atingindo apenas cerca de 0,1% dos animais. O veterinário relata que o laudo da
necropsia foi mesmo inconclusivo, mas que a alteração gastrointestinal não pode
ser causada por medicamento, sendo que era uma doença preexistente e não é
possível sua constatação no momento do exame se não estiver apresentando os
sintomas típicos.
Assim, das provas produzidas nos
autos não é possível deduzir sobre o erro médico da veterinária e o dever de
indenizar. Aliás, nem sequer é possível concluir a exata causa da morte do
animal, sendo que somente a realização de perícia indireta poderia dirimir as
divergências instauradas, concluiu o relator do processo.
Por fim, o veterinário nada deve
sobre o dever de pagar indenização.
TJSP. 35ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO. Apelação nº 0033481-37.2013.8.26.0506 4
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